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Estela antropomórfica

por Nathalie N. Hager
Estela antropomórfica, El-Maakir-Qaryat al-kaafa perto de Ha’il, Arábia Saudita, 4o milênio a.C. (4000-3000 a.C.), arenito, 92 x 21 cm (Museu Nacional, Riyadh)
Estela antropomórfica, El-Maakir-Qaryat al-kaafa perto de Ha’il, Arábia Saudita, 4o milênio a.C. (4000-3000 a.C.), arenito, 92 x 21 cm (Museu Nacional, Riyadh) (Fonte da imagem)

Uma Estela Antropomórfica de Ha’il

Esta estela é alta, medindo aproximadamente 90 centímetros de altura. Mas não é apenas a sua altura que faz esta escultura de pedra auto suportada parecer humana, ou antropomórfica.
Embora ambos os lados sejam esculpidos, a ênfase está na frente, particularmente na face, no peito e na cintura: uma cabeça trapezoidal repousa diretamente sobre ombros quadráticos com o contorno de uma face moldando dois olhos pouco espaçados e um nariz achatado; no tronco vestido da figura pende um colar com dois cordões cruzando diagonalmente o corpo com uma sovela (uma pequena ferramenta pontiaguda); na cintura, uma adaga de duas lâminas pendurada de um cinto largo que continua nas costas. A escultura é simples, até mesmo abstrata, mas claramente representa uma figura humana.
Encontrada numa pequena vila próxima a Ha’il no noroeste da Arábia Saudita, esta estela antropomórfica (parecendo um humano) foi uma das três descobertas na região. O trio se junta a uma coleção de mais de sessenta esculturas em baixo-relevo de formato humano datadas do quarto milênio a.C. e descobertas ao longo de toda a Península Arábica nas últimas quatro décadas. Apesar do vasto território em que foram achadas (cerca de 2.300 quilômetros, estendendo-se da Jordânia ao norte até o Iêmen no sul) essas estelas compartilham certos traços e características. Como isso é possível?

A Pre-história da Arábia

Mapa da península árabe
Embora hoje a Arábia Saudita seja conhecida pelas areias do seu deserto ou pelas suas reservas de petróleo, no período pré-histórico o ambiente e a paisagem eram completamente diferentes—mais fértil e verdejante, e facilmente acessível aos humanos: petróglifos da idade da pedra retratam pessoas caçando avestruzes (veja abaixo), um pássaro que não voa que não foi capaz de sobreviver na região por milhares de anos.
Foi durante o período Neolítico, do sexto ao quarto milênio a.C., quando a península Arábica parecia mais uma savana que um deserto, que pequenos grupos de caçadores-coletores gradualmente mudaram sua economia de predação para produção, ao domesticar animais de rebanho como ovelhas, cabras, e gado, e se fixar em oásis e regiões montanhosas ligadas umas às outras por trilhas de caravanas. Devido às mudanças das condições climáticas estes assentamentos eram na maioria das vezes apenas temporários—ocupados sazonalmente mas repetidamente, e provavelmente por séculos—porém foi essa necessidade constante de movimento que estimulou a comunicação entre as regiões e a interação entre as sociedades. Mas mais do que apenas pessoas se deslocaram pelas trilhas de caravana da Arábia: idéias e objetos também viajaram.
Gravação em pedra representando uma caça à avestruz: 'Cavaleiros de Wadi Uqla e avestruz", Oasis Tayna localizado no noroeste da Arábia Saudita
Gravação em pedra representando uma caça à avestruz: 'Cavaleiros de Wadi Uqla e avestruz", Oasis Tayna localizado no noroeste da Arábia Saudita

Representação Figurativa na Arábia Pré-islâmica

Em uma parede rochosa em Tabuk, perto da fronteira Jordânia-Arabia Saudita, duas silhuetas humanas datando do período Neolítico posterior mostram o mesmo cordão, sovela, e a espada de dois gumes que a estela de Ha’il. Em Riqseh, no sul da Jordânia, uma estela quebrada foi encontrada com uma sovela e uma espada similares. Enquanto no sul da Arabia estelas são consideravelmente menores do que no norte (algumas chegam a apenas 40 centímetros de altura), exemplares de Rawk no Iémen apresentam a mesma falta de detalhes característica que a estela de Ha’il. Essa evidência de influência de estilo, juntamente com a presença de materiais exógenos (materiais provenientes de outros lugares), confirmam que durante o período Neolítico objetos circulavam e eram e trocados em amplas extensões de território.
Três estelas antropomórficas datando do 4º milênio a.C., encontradas no noroeste da Arábia Saudita, perto de Ha’il e em Tayma © Photo: Haupt & Binder
Três estelas antropomórficas datando do 4º milênio a.C., encontradas no noroeste da Arábia Saudita, perto de Ha’il e em Tayma © Photo: Haupt & Binder
O que também é tão interessante quanto esse o repertório visual comum é o antropomorfismo compartilhado: cada estela representa uma figura masculina ereta esculpida em pedra—notável, porque é uma representação figural em uma terra onde se pensava por muito tempo não haver nenhuma. De fato, para muitos, a história da Península Arábica começou com a ascensão do Islã no século VII d.C., quando a expressão artística era focada na palavra escrita e a forma humana era geralmente ausente. Mas o que a estela de Ha’il revela—o que o conjunto total de estelas antropomórficas nos mostra—é a existência de uma Arábia pré-Islâmica onde a figura humana domina.

Arábia: uma península aberta na encruzilhada do comércio

A arqueologia é um campo de estudo relativamente novo na Península Arábica: surpreendentemente, somente nos últimos quarenta anos os cientistas puderam lançar luz sobre a cultura material primitiva da Arábia Saudita, para reconhecer um passado histórico e cultural grandemente ignorado e que se pensava não possuir importância alguma.
Antes que a Arábia comercializasse incenso, antes do Islã (quando os muçulmanos viajavam em peregrinação a Meca), durante o período Neolítico as primeiras rotas de caravanas se expandiram numa rede intra-regional, que acabou por se espalhar externamente com o contato entre a Arábia do Leste e a Mesopotâmia. Foi este contato inicial que posicionou a Península, na Idade do Bronze e através da Antiguidade, como o centro de um Mundo Antigo ativo e interconectado—um entroncamento comercial e cultural ligando Leste e Oeste—unindo comércio e rotas de peregrinação que ligavam a Índia e a China ao Mediterrâneo e o Egito, o Yemen e a África Oriental à Síria, Irã e Mesopotâmia.

Interpretando a estela de Ha’il

Apesar das aparentes semelhanças visuais, seria um grave erro assumir que os significados e símbolos de cada estela eram os mesmos em toda parte—acredita-se que cada região, vila, e tribo era diferente em costumes e desenvolveu fortes tradições locais. Para evitar o risco de atribuir significados generalizados para distintas estelas antropomórficas escavadas em toda a Península Arábica, os estudiosos têm focado cada vez mais na cultura local em sua análise da história material. Em outras palavras, eles olham além do que parece ser um estilo comum para conduzir uma análise refinada de cada objeto em um contexto único de práticas sociais e rituais locais. Com isso em mente, como interpretamos a estela de Ha’il, um dos mais antigos artefatos conhecidos da Península Arábica?
Os arqueólogos acreditam que a estela de Ha’il era provavelmente associada a práticas religiosas ou funerais, e possivelmente foi usada como uma lápide em um santuário a céu aberto. Embora não saibamos quem produziu a estela (apenas imagine um escultor especialista em rocha, trabalhando entre pastores nômades), nós continuamos intrigados pela qualidade da escultura e sua minimalista, embora expressiva, representação da figura humana.
Ensaio de Nathalie Hager
P.S.: O fenômeno global da estela
Embora as estelas de pedra esculpidas ou gravadas fossem utilizadas principalmente como lápides, elas também foram utilizadas para dedicatória, comemoração e demarcação. Estela é o termo usado com mais frequência no Mundo Mediterrâneo, embora objetos similares chamados por outros nomes e criados na maioria dos períodos tenham sido encontrados em todo o mundo, incluindo o Antigo Oriente Próximo, o Antigo Egito, Grécia e Roma, China, as terras Islâmicas, a América Central e a América do Sul Pré-Colombianas.
Alguns exemplos da Smarthistory:

Recursos adicionais
Rémy Crassard and Phlipp Drechsler, "Towards New Paradigms: Multiple Pathways for the Arabian Neolithic.” Arabian Archaeology and Epigraphy 24 (2013), pp. 3-8.
Ute Franke, “Early Stelae in Stone," Roads of Arabia: The Archaeological Treasures of Saudi Arabia, editado por Ute Franke e Joachim Gierlichs (Tubingen: Wasmuth Verlag, 2011), pp. 68-71.
Tara Steimer-Herbert, “Three Funerary Stelae from the 4th Millennium BC,” em Roads of Arabia: Archaeology and History of the Kingdom of Saudi Arabia, editado por Ibrahim Al-Ghabban, Béatrice André-Salvini, Françoise Demange, Carine Juvin, e Marianne Cotty (Paris: Somogy Art Publishers: 2010), 166-169.

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